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Abril, 2022

não durmo #9 💬 - notas diárias 🎵 - como melodias definem as narrativas em Hellblade e Interestelar

naodurmocast | 13 min de leitura 📖

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Deixa eu te falar que sempre haverá uma trilha sonora para cada momento da nossa vida. Não vamos nos apegar aos clichês… quer dizer, vamos, sim! Desde quando o clichê é ruim? Afinal, não somos feitos de momentos piegas?

Talvez você não seja o tipo de pessoa que ouve música o dia todo, mas certamente em algum momento que você já viveu, ecoou no fundo da sua mente aquela música, ou ela veio mais tarde, ao relembrar do evento, a trilha sonora perfeita.

Nós, afortunados, somos definidos pelas trilhas sonoras. A música instiga aquele espírito revolto que nos leva durante a adolescência, principal - pois é quando descobrimos o quão cruel e confuso o mundo pode ser -, aos shows de punk, convertendo nossos medos, dúvidas, ansiedade e tantos outros sentimentos que se misturam e explodem em suor, vezes álcool e fúria. Ela está lá quando sentimos o peso da culpa, da perda, da frustração e não temos orgulho de compartilhar isso com alguém, acuados em melodias soturnas e letárgicas. Também em acordes excitantes e vibrantes como quando acordamos e vemos o sol brilhar mais forte, há mais sorrisos e outras coisas que aquecem o coração.

Mas a trilha sonora também pode ser uma merda, pequenas notas que arranham no fundo da nossa mente e nos levam a loucura, caminhando pelo espinheiro salgado de memórias que deveriam estar enterradas ou amassadas em alguma lata pelo mundo que construímos dentro da cuca. Lapsos de traumas que pareciam tão distantes, mas agora batem novamente na nossa porta.

As notas diárias que vivemos e sobrevivemos, definitivamente elas nos definem, assim como o silêncio… curioso, não é? Mas hoje vamos focar no som e não na sua ausência. 

Um aviso gritante é exibido no início de Hellblade, o jogo contém conteúdo e cenas que podem ser violentas para pessoas com sensibilidade psicológica, ele todo foi construído com vários propósitos, mas cuidadosamente tratado, e com auxílio de profissionais da saúde mental, para apresentar visualmente a luta de Senua, a protagonista, em uma jornada de vida e sua convivência com a psicose.

Enquanto Senua percorre o mundo real e ao mesmo tempo o irreal, somos surrados por uma direção de arte impecável, que busca trazer visualmente o tormento que essa condição psicológica proporciona, em outras palavras, ele chega a ser, em muitos momentos, confuso, asfixiante e nauseante. Essas qualidades não o tornam uma experiência impossível, mas definitivamente é um desafio para quem quer explorar mais e mais da história incrível que é narrada por Senua e tantas outras vozes.

Certamente Hellblade seria uma experiência vazia se não fosse pela trilha, talvez tanto quanto toda e qualquer outra experiência que possamos ter. As músicas trazem aspectos tribais, compostas por diversos instrumentos que criam a harmonia perfeita para nos proporcionar uma nova dimensão do que Senua está sentindo. Conseguimos ficar confusas quando ela está confusa e há suspiros ecoando acompanhados de leves notas de instrumentos de sopro, ficamos enfurecidas quando as percussões explodem e vemos Senua em combate, com um inimigo ou até si mesma, e tristes quando vozes criando notas tão intensas e profundas por, em alguma nível e mesmo sem compreender o todo, conseguirmos entender o que a entristece e a faz chorar.

Hans Zimmer faz de forma brilhante, ele também nos provoca, cativa e enfurece e às vezes ao mesmo tempo. É claro como, tanto quanto a direção de arte e outros aspectos visuais dos filmes, a trilha sonora é o ponto chave para que tudo funcione como deve, mas no core, ela é a cola que une a expectativa às reações. Nos campos de uma Terra em decadência, a trilha se inicia sutil, tomando proporções em uma cena simples onde Cooper e seus filhos perseguem um drone desgarrado em Interestelar. O crescente exponencial da melodia traduz perfeitamente a emoção que as personagens sentem e se torna grandiosa, assim como vamos sentir quando a Endurance se prepara para mergulhar no buraco negro Gargântua.

A complexidade da trilha sonora é o gatilho para nossas emoções, as músicas não servem apenas para passar uma mensagem, mas como em uma composição por inteiro, ela é uma nota dentre tudo o que faz parte de uma narrativa visual dinâmica, assim como o que é exibido, o processo criativo, a maquiagem, figurino, cada um em sua peculiaridade. Talvez tenha algo enraizado com o princípio do cinema, quando os únicos sons dentro de uma sala eram de espanto ou gargalhadas, uma maneira confortável de sentir e não pensar nas notas que ouve, afinal, quando foi que você saiu do cinema e a primeira coisa que você comentou de um filme por ter te chamado a atenção foi a trilha sonora?

Nos tornamos mais exigentes conforme descobrimos novas experiências com as artes, não à toa já existem premiações que dão grande foco para o que se faz além do visual e reconhece que a trilha também é uma narrativa, por vezes complementar, auxiliar ou até mesmo com uma diálogo diferente.

As emoções florescem o tempo todo e no nosso inconsciente, algumas reações podem vir a partir de memórias de outros momentos em que certas notas foram captadas e podemos até nem entender o que estamos sentindo e o seu motivo.

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Nº9 • T02 • ABR/22


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